quarta-feira, 19 de abril de 2017

poema que dorme

(a Maria Carolina Victorio Castelar
que começou o poema num devaneio)

neste escuro
silenciado
pelo morrer
de cada

tic
e
tac

procuro
paz
no meio
da angústia
de saber
que daqui
adiante
cada segundo
estará
divido
ao meio
por

um tic
e
um tac

(e de fato há muito pouco a ser feito
poderia ter aberto mão de dar corda ao relógio
ou ainda livrar-me dele ou transferi-lo a um cômodo distante
mas que dizer ao professor de epidemiologia
que me aguarda ansioso às oito em ponto
para a sua brilhante exposição de slides)

tic

(sempre essa previsibilidade de no próximo meio segundo ouvir tic
e no próximo
tac)

tac

(e nessa suspensão forjada
a esperança vazia de alcançar o próximo meio segundo por um atalho
um túnel um viaduto um buraco
por onde eu escape da sinalização mecânica do tempo que se dá à minha volta)

tac

(e então
num suspiro quente
num instante em que olhos movem-se ligeiramente
saber-me uma outra um espelho um devaneio
fugindo de um frenesi infinito
saltando de cenário em cenário
e ainda assim em paz
a salvo do próximo tic)

trim

segunda-feira, 3 de abril de 2017

poema ocupado

desculpa

sei que ando ausente
e quando presente

(eventualmente
faço-me presente
por descuido ou
por necessidade de primeira grandeza)

tendo a fazer
tolices

é que tenho ocupado-me de
dar conta de um
ou outro problema

e aí
acabo que me canso
e não
dou conta de umas 
outras coisas simples 
como

enviar e-mails
telefonar
e escrever poemas

mas entende
isso tende a mudar
tenho tentado organizar
os afetos
tenho tentado forjar
a ferro o meu ócio 

e qualquer hora
ocupo meu tempo
com o teu tempo

(que é a termo
este dissabor)



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