sábado, 3 de agosto de 2013

poema no assassinato de um trabalhador

a Ricardo Ferreira Gama

1.
pouco nos falamos
enquanto limpavas
o chão em que eu
pisava
enquanto puxavas com o rodo
a água da chuva sob a chuva

enquanto punhas em ordem

as cadeiras
as carteiras
os carpetes

para eu passar

mas foste tu quem passou

2.
pouco nos falamos

bom dia boa tarde
oi até mais
obrigado disponha
etc etc

no dia em que tivemos assunto
ele era tu
e logo
o assunto morreu

3.
talvez faças pouca falta

as cadeiras
as carteiras
os carpetes

seguirão arrumados
e além do mais
teu trabalho não gerava
mais valia

talvez em muitos
tua morte não produzirá saudade

(há quem não note a mão
que produz o produto
até que ele falhe ou falte

e teu trabalho
persistirá a ti)

4.
infelizmente não creio em
vida após a morte
mas crê
haverá luta na tua morte

para que mude o estado das coisas
para que chegue o dia
em que o estado não mate

ao contrário
morra

e aí
tu não serás morto
(nunca mais)

4 comentários:

  1. Emociona! A força do poema traz o desespero por encontrar o rumo seguro para mudar o que parece tão sólido. Estado e capital não podem continuar tombando trabalhadores! Ricardo Gama não é mais um, estamos presentes, não permitiremos que a ordem das carteiras, cadeiras, carpetes ordene nosso esquecimento! Ricardo Gama, presente!

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