sábado, 13 de outubro de 2012

poema no. 307

se choro
é porque ainda sei chorar

ainda tenho em meu peito dores que existem apesar de mim
de você

que existem ao longo de mim e de você
e me impedem de ser o que quero ser
ou mesmo o que esperam que eu seja
ou mesmo o que eu espere que

se choro
é porque minha luta infantil
contra este mundo adulto e insano
não apresenta resultados concretos
e sim
talvez nunca os veja
talvez nunca aconteça
talvez só servirá para arrastar mais e mais
homens e mulheres e crianças (meninas e meninos) para uma luta infantil
contra este mundo adulto e insano

não é o seu desapreço por meu corpo
não é o seu desapreço por meus modos
não é o seu desapreço por meus medos
não é você

mas a vida
as condições de existência concretas
que me empurram
e resisto
e me empurram mais
e resisto
e resisto

se choro
é que a vida dói
com seus torniquetes
com seus dedos ferindo ainda mais as feridas
cutucando devagar as cascas ainda jovens
dolorindo e rindo

mas
a vida passa
não como passa um automóvel numa noite de sábado
não como passa uma dor

a vida passa
mas não passa como passa um pássaro na praia
alegórico
nem como passa um dia ou um tempo qualquer
em qualquer dia

passa
mas passa imóvel
quieta
inerte

como se não passasse
mas
passou

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